sábado, 6 de outubro de 2007

EM TRÂNSITO


Em trânsito

Perdido. No centro da cidade.
P-E-R-D-I-D-O.
Soletro para deixar bem claro
como me sinto nesse momento de exaustão.
Os dias me encurralam.
As paredes dos edifícios comerciais me oprimem.
O buzinar incessante dos carros
Aliado aos berros irritados dos motoristas estressados
desnorteiam meus passos já confusos.
Fazem com que eu vá para trás
quando o que eu mais desejo é seguir em frente.


E pra quê?
Pra que tanto rebuliço,
tanta gritaria,
tanto tumulto,
tanta falta de coordenação?
Eu simplesmente não entendo.
Meu professor de história dos tempos de primário
vivia dizendo que a sociedade cresceria
130% nos próximos 50 anos.
E eu, estupidamente, não acreditava.
Agora estou aqui imerso nesse circo de loucos,
nesse ir-e-vir incessante e sem rota definida,
preso, acorrentado, encarcerado,
vítima desse seqüestrador alucinado
que é a sociedade.


Eu venho caminhando (correndo) apressado.
A distância que me separa da rua
onde ônibus e táxis frenéticos duelam avidamente
é de menos de cinco centímetros,
praticamente o tamanho do meio-fio.
Eu levo uma cotovelada nos rins
acompanhada de um empurrão dado por uma anciã
que, irritada, ainda passa a minha frente cheia de si.
E os pedestres cortantes?
Aqueles que do nada cruzam o seu caminho
sem avisar muito menos pedir licença?
Esses, então, são milhares. Chegam a irritar.


Eu paro rapidamente para olhar as horas
num imenso relógio de rua infestado de pichações
(malditos pichadores!).
11:55.
Faltam cinco minutos para o inferno.
A hora do rush.
A hora em que as ruas se transformam
na maior selva já vista.
A hora em que ninguém manda em ninguém
e todo mundo acha que tem razão
e tem mais pressa do que os outros
e acha que o seu compromisso é o mais importante.
A hora do almoço.


Eu acelero ainda mais os passos.
Chego a Cinelândia acreditando inocentemente
que ali haja mais espaço para andar folgado,
sem esbarrar nas pessoas ou envolto
num espreme-espreme cruel e injusto.
É ruim, hein?
Segunda-feira?
O dia que todo mundo gostaria de não ter de trabalhar?
Não mesmo!
Se eu estivesse dentro de um helicóptero
e sobrevoasse de cima toda aquela região
veria um imenso formigueiro desordenado.
Agora eu sei porque no cinema tantos diretores
adoram gravar cenas de congestionamentos
ou multidões correndo em metrópoles alucinantes.


Que sufoco!
A caminhada não acaba.
Os empurrões não acabam.
Os cortantes não acabam.
O tumulto não acaba.
Só a minha paciência acaba.
Aliás, a minha paciência acabou
quando eu saí da Presidente Vargas
e adentrei a Avenida Rio Branco.
Pior é não poder fugir dessa rota
por não ter outra opção de caminho!
Vejo agora o cinema Odeon (finalmente!).
Tudo isso, todo esse corre-corre
só para entregar um envelope a um gerente.


Eu entro no cinema, ainda vazio,
o gerente (Luiz? Lucas? Sei lá! Tanto faz)
se apresenta, eu corto o papo e entrego a remessa.
E parto (afinal, vim aqui só para isso).
Acho que nem disse meu nome.
E daí? Que diferença faz?
Só o que eu desejo naquele momento
é sair daquele lugar infernal,
do olho daquele furacão,
livrar-me daquela multidão de atletas enfurecidos
capazes de botar no chinelo qualquer medalhista olímpico.
Penso que se cada uma daquelas pessoas
com toda aquela pressa (não se sabe ao certo do quê)
trocassem de profissão e ingressassem na carreira esportiva
o Brasil seria o maior representante mundial
na categoria atletismo.


Perguntou ao jornaleiro as horas:
“Meio-dia e dez”, ele grita.
E olhando agora decidido para todo aquele enxame,
penso comigo mesmo:
quanto desperdício de talento,
quanta energia mal gasta,
é...
Chega de sonhar!
É hora de voltar pro trabalho.
Pra onde é que eu ia agora mesmo?





domingo, 16 de setembro de 2007

PEQUENOS TAKES DE UM MUNDO CAÓTICO



Pequenos Takes de um Mundo Caótico


Meninos de rua esmolando
e fugindo dos cassetetes dos guardas aflitos
que reagem de forma bruta, visceral,
à impaciência da sociedade que cobra
uma atitude voraz, rápida, efetiva
das autoridades apáticas.


Taxistas irresponsáveis
que burlam as regras,
infringem sinais de trânsito a cada cem metros,
adulteram velocímetros para explorar passageiros,
todos os meios possíveis para conseguir
usurpar um pouco mais,
faturar um tostão a mais.


A imprensa sensacionalista
promove cidadãos medíocres
como se fossem estrelas de cinema,
enquanto o povo trabalhador
visto somente nas páginas policiais,
lua diariamente por um pôr-do-sol digno,
mais justo e sem tantos preconceitos.


Pequenos retratos,
takes diários,
memórias instantâneas,
uma miscelânea do que acontece
dia e noite pelas ruas,
perturbando, instigando, forçando
o ser humano a agir, pensar
e, finalmente, se indignar
mediante tanta desolação.


O autor dessa tentativa frustrada
e descabida de narrativa poética
volta e meia se pergunta atônito
quando e onde tudo isso irá parar.
Até que ponto permitiremos mais
tanto desconforto, tanto desentrosamento,
tanta falta de habilidade
para enfrentar uma solução
que estanque de uma vez por todas
esse desprazer, essa inércia,
essa falta de ação
que hipnotizou o povo nos últimos anos?


Os políticos, falsos governantes,
escondem-se atrás de bordões do tipo
“estamos trabalhando”,
os menos afortunados, acuados
ante toda a violência e incompreensão,
sofrem, praguejam, choram
e nada podem fazer de imediato
para confortar o inconsolável coração
que não pára de bater descompassado,
vítima de tanta fúria e opressão.


Na TV, no rádio e nos outros meios de comunicação
os BBBs, as divas artificiais, o hip-hop
“programam” automaticamente essa sociedade corrompida
com suas músicas monossilábicas,
suas grades de transmissão ditas populares
e seus artistas carregados de maquiagem.
Por outro lado, os não-artistas,
aqueles que não nasceram com o suposto “dom”
capazes de fazê-los brilhar na telinha,
contentam-se com os esfregões,
as vassouras, os banheiros sujos
e os subempregos mal remunerados.


Tudo isso e muito mais
acontece automaticamente:
24 horas por dia,
30 dias por mês,
365 dias por ano,
há décadas, séculos, milênios
e nada é feito para contornar
esse automatismo que incomoda (que irrita)
e facilita somente a vida daqueles que elaboraram
esse projeto chinfrim chamado civilização.


O que fazer?
Como fazer?
Quando fazer?
Por que fazer?
Com quem fazer?
Perguntas que se repetem,
se acumulam, se arrastam,
sôfregas, carentes de uma força de vontade
da parte de um único ser humano que seja.
basta um!
Que tome as rédeas da situação
e nos ofereça uma nova proposta
para esse limbo social o qual habitamos
e faça essa máquina fotográfica cruel
que é o sistema em que estamos imersos
parar de exibir essas tomadas degradantes,
cheias de ódio incontrolável, rancor
e solidão








domingo, 9 de setembro de 2007

METRÓPOLE



Metrópole


Urbes congestionadas
Motoristas estressados
Pensamentos eclipsados de dor:
este sou eu
O conjunto destas alucinações que me rodeiam.


Quando saio de casa mais cedo
enfrento as mazelas da multidão
escoradas por veículos envenenados
cujos mártires na direção
nada mais são
do que o espelho de minhas próprias atitudes


Buzinas
Urros incompreensíveis
Prostituição nas calçadas
A música que reverbera dos quiosques
Este é o som da metrópole
que mais parece um galope
do que uma canção


E no meio de toda esta gente
cansada de sofrer,
de temer,
de correr,
do tumulto que as ruas guardam
do rugido que os transeuntes exaltam
sobrevive o cidadão intimidado


O que será do amanhã,
se nada vejo no ontem e
se não me lembro do que passou
Porca memória
que me foge aos dedos
sem nem ao menos avisar
sequer alertar
para aquilo que sou:
um mísero mortal
preso a metrópole.


Culpado?
Inocente?
Ambos?
Não sei mais o que faço de minha vida
Não sei o que sobra de racional pra contar


O que me resta
é este único desatino chamado sobrevivência
que me empurra pra frente
e me faz encarar as ruas,
as vielas,
os becos,
enfim,
o que a pólis me der